segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A culpa é de quem?

Achei interessante a matéria abaixo, porque nos faz reabrir sempre a velha crítica pessoal, relembrando o seguinte dilema: comprando produtos piratas ou afins, acabamos por penalizar o Estado, por "supertaxar" os produtos em questão, ou penalizamos a nós mesmos, dada a auto-enganação e vício de cultivar a imagem predileta perante a sociedade? Eu particularmente, acredito que fazemos os dois (mais a segunda opção, porque na verdade o Estado já recolhe tributos pacas...).
Este texto foi originalmente escrito pro Xico Vargas, em seu blog (www.xicovargas.uol.com.br).

"Estamos sempre prontos para acolher a contravenção
07-02-2010
Da Cinelândia, no Centro do Rio, às praias do litoral paulista, estamos sempre prontos a ser enganados, a que alguém nos passe a perna. E fazemos isso com gosto. De óculos de grife pirateada a mate feito com água contaminada temos linhas de produtos que sequer pretendem iludir o consumidor.
Os óculos têm lentes escuras, mas não protegem os olhos da radiação ultravioleta. Ao contrário. Com a sombra produzida pelas lentes a íris dilata e os olhos sofrem mais. Mas e daí, quem liga? Ninguém disse que protegiam. Os mesmos óculos, com as mesmas armações e lentes estão nas ruas do país inteiro.
Em Ipanema ou no Guarujá, ou em Ubatuba, ou em Torres, até as pessoas que os vendem se parecem. São tão grandes os estoques e tão variados os modelos que é impossível imaginá-los trazidos às escondidas pelas fronteiras. Chegam em contêiner, sim, às claras, como os relógios de todas as bandeiras da pirataria.
Como ninguém nega que sejam falsos, compramos porque certamente também gostamos de achar que alguém está sendo enganado. Nem que seja o interlocutor que nos vê com um Rolex miando no pulso. Tudo isso pode ter um punhado de explicações. Só não a encontro para a venda de DVDs piratas em Ilhabela, refúgio paulista de abastados.
Por módicos cinco reais, menos, portanto, que o preço de uma cerveja nas praias da ilha, pode-se comprar a versão pirata de qualquer filme em exibição nos cinemas. Neste fim de semana, Avatar foi um campeão de vendas.
Não havia dúvida possível sobre a qualidade da mercadoria: era de quinta. Mas isso em nada comprometeu o movimento. Os compradores não eram de baixa renda, já que não há essa categoria em lugares onde uma cerveja custa dezoito reais. Só faltaram fila e senha.
Essa prática brasileira de homenagear a marginalidade é que torna toda contravenção muito parecida com o carnaval carioca. O ano inteiro o Rio fala mal dos barões do jogo do bicho. Mas no Carnaval aplaude e gasta o que não tem para desfilar nas escolas de samba que eles patrocinam. No resto do ano rendemos homenagem aos pequenos bandidos só pela sensação de levar vantagem. Depois, nos queixamos quando o troco vem em bala."